Resolvi escrever este artigo para compartilhar um pouco da minha experiência como líder técnico (Tech Leader) do desenvolvimento de um produto de PDV (Ponto de venda), para aspirantes ou até mesmo entusiastas que almejam conhecer um pouco mais desta posição.
Dividirei este texto em 4 partes (de habilidades fundamentais) que, de acordo com a minha experiência, vão fazer toda a diferença no dia a dia de um líder (mesmo que você não queira ser um líder):
1 — Conhecimento técnico; 2 — Experiência e gestão; 3 — Comunicação; 4 — A Frustração.
Onde tudo começou
Para começar a contar, nada melhor do que contextualizar como tudo começou. No ano de 2015, um novo projeto chegou na mesa da então Gerente de Projetos. Um projeto de um novo sistema de PDV que deveria, por supuesto, possuir uma usabilidade e experiência totalmente inovadora e contar com as tecnologias mais recentes de mercado.
Então iniciou-se o projeto, que foi implantado em um cliente piloto e pronto. Mas e agora? O que fazer? Era necessário evoluir o produto e dar manutenção, e este trabalho deveria ser feito por uma equipe dedicada, com gestão e papéis próprios bem definidos. Foi aí que surgiu o convite para que eu fizesse parte deste time, vestindo a camisa de líder para levar o produto adiante.
No início, bugs e travamentos inesperados faziam parte da rotina. Sempre fizeram, na verdade. Conversas diretamente com o cliente, com o suporte, configuração VS bug VS feature (IT’S NOT A BUG). Era um caos.
A questão era que aquele produto estava em funcionamento em somente um único cliente, e com um arquitetura totalmente nova e diferente daquilo que já vínhamos trabalhando até então. Era preciso que o time escolhido fosse devidamente treinado e seguisse um fluxo de trabalho bem definido e frictionless. Isso, obviamente, não aconteceu logo. O que se sucedeu foi todo tipo de conflitos que consumiam energia e tempo que nós praticamente não tínhamos. Mas, felizmente, tudo isso que aconteceu acabou engrandecendo o time e me ensinando lições valiosas, além de dar condições de levar o produto adiante, que hoje conta com mais de 700 clientes implantados e felizes com o sistema e um futuro promissor :).
Sem mais delongas, vamos ao que interessa:
Conhecimento técnico
Um bom líder técnico possui como característica um amplo rol de conhecimentos em técnicas utilizadas para resolução dos problemas corriqueiros do trabalho no produto (ou projeto) em que está atuando. Essas habilidades, via de regra, vão sendo adquiridas e moldadas com a experiência. Porém, como líder, você deverá estar sempre um passo a frente de seu time, isto é, antecipando os próximos movimentos e se preparando para repassar os próximos desafios à equipe, esclarecendo os possíveis questionamentos que venham a surgir.
Isso significa que você sempre irá se deparar com situações novas, e precisará destrinchar diversos desafios antes de entregá-los ao time. Este conhecimento você irá, normalmente, buscar na literatura, seja em artigos ou sites de pesquisa. Ah, eventualmente você também irá se deparar com materiais em vídeo e outras mídias (podcasts), então fique antenado no que você precisa!
Por isso, é importante se acostumar com a leitura de documentação técnica. E por falar em documentação técnica, dependendo da sua área de atuação, essa leitura normalmente estará disponível somente em inglês. Hoje, por exemplo, python é uma linguagem com bastante adesão no mercado brasileiro, o que por consequência trouxe também muito material em português. Mas quando você é pioneiro, terá que se virar com o que tem, e até lá nos idos de 2015 muita documentação estava disponível somente em inglês (e em muitos casos, ainda está). Isso traz não somente o desafio de entender do idioma, mas de interpretar corretamente o que está escrito. Além disso, novas técnicas de desenvolvimento e novos frameworks sempre estarão documentados primeiro em inglês, tornando obrigatório o conhecimento avançado de leitura nesse idioma.
Documentação não vem com o exemplo que você precisa, saiba interpretar!
Resumindo: Você nunca sabe quando será surpreendido e precisará ter uma grande capacidade de adaptação e também de respostas rápidas.
Para concluir: comece a buscar o hábito de sempre ler documentação. Normalmente será mais fácil você acompanhar as atualizações das tecnologias que utiliza, assinando serviços de RSS e acompanhando artigos escritos aqui no próprio Medium (ou qualquer lugar que você preferir) que tratam sobre o changelog das versões. Acredito que esse já seja um excelente começo para se adaptar a ler e interpretar corretamente qualquer tipo de documentação com que você venha a se deparar. Não perca tempo e comece já!
Experiência e gestão
Novamente: o seu cotidiano te colocará frente à diversas situações, algumas vezes reveses, outras vezes sucessos, e será importante você sair com a bagagem maior do que entrou em todas essas situações.
Você precisará ter uma visão diferente do negócio que você está desenvolvendo. Isso quer dizer que você não deverá mais somente se preocupar com o aspecto técnico, seja de código fonte (famoso: Compilou! Vai pra qualidade!), seja de negócio (Mas na minha máquina funciona!). Existe todo um ecossistema ao redor daquilo em que você está trabalhando e você precisa estar consciente disso. Clientes terão a expectativa de receber um produto bonito, rápido e cheio de funcionalidades bacanas. O seu gerente irá se preocupar com o prazo do que você está fazendo, os diretores, por sua vez, com o custo e retorno que isso que você está fazendo trará. Por outro lado, as pessoas da sua equipe vão precisar que você saiba, com uma certa certeza, o que está sendo construído e lhes dê a devida orientação.
O papel de líder técnico traz pra você a responsabilidade de satisfazer, da melhor maneira possível, todas essas expectativas. Você não pode deixar o cliente sem a feature X, mas também não pode estourar nem os prazos e nem os custos. Se você já trabalha há algum tempo naquilo (produto ou projeto) que você irá liderar, será mais fácil. Caso contrário, você irá errar bastante no início e isso será normal, mas será preciso aprender rapidamente e crescer juntamente com a equipe e com o negócio que você está construindo. E eu digo aqui negócio, porque não se trata mais somente do produto ou projeto que você está construindo. Você deverá ter um olhar mais estratégico, de negócio, para que aquilo que você construir seja efetivo e atenda as devidas expectativas dos stakeholders, e também do time, no que diz respeito à prazos, clareza de informações e às prioridades do negócio.
Para desempenhar bem o papel de liderança técnica, é importantíssimo estar bem alinhado às diretrizes da empresa. Isso acontecerá com um bom alinhamento entre o líder e o gestor do time (normalmente o gerente de projetos ou product owner). Eu acredito que não existe um bom líder técnico sem um bom gestor, em um cenário onde ambos estejam 100% alinhados. Isso porque pouco adianta você ter toda a experiência e conhecimento se você não possuir um olhar crítico e estratégico do negócio, que só será efetivo se você estiver em linha com o que está sendo buscado pela área responsável pela gestão estratégica da empresa.
Resumindo: Você terá o papel de buscar aquilo que foi proposto (ou negociado) pelas pessoas responsáveis pela empresa. Então busque sempre um alinhamento direto (conversas pessoais, seja num café ou almoço) para saber aquilo que te espera na próxima esquina (semana que vem, próximo mês ou até mesmo próximo semestre) e planeje (e faça gestão) dos seus esforços de acordo. BÔNUS: Esses alinhamentos serão quase sempre com seu gestor direto, mas esteja atento e identifique outras fontes importantes de alinhamento, como pessoas de outras áreas ligadas ao seu negócio (até mesmo clientes).
Comunicação
Sim, eu sei… é óbvio: A (boa) comunicação é uma das (senão a) principais ferramentas de qualquer profissional.
Mas vamos ao que interessa:
Um conflito é qualquer diferença de interesses ou pensamentos ao qual dois ou mais agentes podem se expôr. Para resolver esta diferença, existem várias ferramentas, porém vou me resumir aqui a como evitar que um confronto aconteça.
“A habilidade suprema não consiste em ganhar cem batalhas, mas sim em vencer o inimigo sem combater.” — A arte da guerra, Sun Tzu (2010, editora Jardim dos Livros).
Um conflito pode ser funcional ou disfuncional. A diferença básica é que um conflito funcional é onde dois pontos de vistas (não necessariamente opostos) são expostos e são avaliados levando à um processo de decisão (prosseguimento) melhorado. Um conflito disfuncional, por outro lado, fixa posições que se tornam confrontos, frequentemente sobrepondo um pensamento em detrimento ao outro. Veja que eu citei que não necessariamente os pontos de vista são opostos, então por que teríamos um confronto? Normalmente isso ocorre devido à uma falha de comunicação.
“Com relação ao conflito, podemos dizer que mesmo quando ele acaba externamente, não nos assegura que internamente ele não tenha deixado o resto, o resíduo.” — Administração de conflitos (Fundação Fritz Müller, Apostila do curso de Administração de conflitos, 2017).
Essa falha de comunicação implicará, quase que necessariamente, em uma falha de interpretação, levando normalmente à um conflito disfuncional.
Isso pode ser evitado desenvolvendo-se uma boa comunicação, clara e objetiva. Para que não hajam desentendimentos, busque sempre contextualizar a situação ao início da conversa (seja ela um e-mail, reunião, ligação, etc). Descreva os pontos em comum (se houverem), qual problema você está buscando solucionar (pois pode ser que a outra pessoa esteja pensando em outro problema), e somente então o seu argumento. Esses 3 pontos-chave devem ser sucintos, porém cobrir com clareza todo o tópico da discussão.
Com um pouco de sorte seu(s) interlocutor(es) interpretará(ão) corretamente o que você quis dizer, e vocês conseguirão sair do outro lado com uma boa decisão e, por que não, um relacionamento fortalecido.
A Frustração
Ah, A Frustração. Veja que até coloquei o artigo definido, por que isso aqui, meu caro, certamente fará parte da sua vida. Então vá se acostumando. Porém, se você estiver seguindo as dicas que deixei aqui, e tiver um bom gestor com quem você está bem alinhado, seus problemas serão minimamente amenizados, assim como foram pra mim.
Precisamos estar preparados para lidar com a frustração em qualquer aspecto de nossas vidas, pois inevitavelmente criamos expectativas em cima de pessoas e situações que nem sempre se concretizam.
Porém o que eu gostaria de colocar aqui é que você eventualmente estará feliz e contente em sua cadeira, programando, analisando, participando de uma reunião ou fazendo qualquer outra coisa, e surgirá ~aquele pokémon selvagem~ aquela pessoa para dizer algo relacionado à como vocês não estavam alinhados. Seja uma funcionalidade mal implementada, um requisito mal explicado/documentado, um processo mal repassado. Veja que o que eu quero dizer aqui é realmente uma falta de alinhamento.
Eu não vou te dizer que você precisa ficar calmo e respirar fundo. É pior. Na verdade você deveria já estar esperando que isso aconteça, pois é inevitável. Aquele seu interlocutor estará em outro momento de vida, com outras prioridades e outros conhecimentos, podendo às vezes não estar consciente do trabalho que você está desenvolvendo.
Sabendo disso, evolua constantemente as 3 primeiras habilidades que eu mencionei aqui neste artigo (principalmente a comunicação). Certamente, quando bem desenvolvidas, essas habilidades te ajudarão a lidar melhor com estas situações e, com sorte, passar por menos frustrações.
Conclusão
Tudo na vida tem seus desafios e, apesar de tudo, com certeza essa é uma experiência muito gratificante. Você terá a oportunidade de colocar à prova, na prática, suas habilidades e aprenderá muito com tudo.
Por hoje é só pessoal, até mais!
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